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Traduzir matéria de Direito é traduzir cultura
Civil Law, Consuetudinário ou Common Law: qual é o seu direito?
O bom tradutor da área jurídica tem de dominar não apenas a linguagem jurídica, mas conhecer a história do continente Europeu e da Inglaterra. Os dois principais sistemas jurídicos do mundo ocidental são o sistema jurídico de common law e o sistema jurídico de civil law. Nenhuma tradução literal desses termos seria completa, pois não englobaria todo o significado, conceito e carga cultural neles contidos em apenas duas palavras. Portanto, esses termos são simplesmente conhecidos como sistema jurídico de common law e sistema jurídico de civil law. Qual desses sistemas é adotado no Brasil? E por quê? Antes de respondermos a essas perguntas, analisaremo s os principais aspectos dos dois sistemas. Ao contrário do que se pensa, civil law não é Direito Civil. A história desse sistema começa quando o imperador Justiniano reúne todas as leis do continente europeu, consolidando-as em um único código, batizado de Corpus Juris Civilis, posteriormente conhecido como Civil Law, Continental Law ou Roman Law. Em países que adotam o civil law, a legislação representa a principal fonte do Direito. Os tribunais fundamentam as sentenças nas disposições de códigos e leis, a partir dos quais se originam as soluções de cada caso. Adotado por países americanos e de origem anglo-saxônica, o sistema do common law é o sistema no qual o costume prevalece sobre o direito escrito. Os casos de direito (case law) são as principais fontes do Direito, ou seja, a base da criação das regras de conduta. Ao contrário do Direito Romano, o direito norte-americano fundamenta-se mais nos usos e costumes do que no trabalho dos legisladores. Contudo, a diferença entre civil law e common law não é o mero fato da codificação, e sim a abordagem metodológica aplicada aos códigos e leis. E então, já descobriu qual é o sistema adotado pelo Brasil? Se ainda tem dúvidas, analise o mapa abaixo: Distribuição
global dos sistemas jurídicos
Qual a relação de toda essa história do direito com nosso trabalho diário como tradutor? O aumento do comércio internacional e das sociedades comerciais internacionais contribuiu para um acréscimo na procura de traduções de documentos societários. Entre os diversos tipos de documentos que surgem no cotidiano do tradutor jurídico, a maior demanda é pela tradução de contratos. Quando se traduz um contrato, é imprescindível conhecer a cultura e a matéria de direito dos países em questão, visando entender certas cláusulas que normalmente compõem um contrato. Ainda não existem critérios definidos sobre como os documentos jurídicos devem ser traduzidos. Alguns tradutores sustentam que a tradução jurídica deve preservar a todo custo a informação do original, mesmo que a clareza e o estilo sejam comprometidos. Por outro lado, outros profissionais preferem respeitar o estilo da língua de chegada, adaptando o documento ao formato padrão do idioma de destino. Meu conselho para quem está começando a traduzir documentos jurídicos é seguir sempre as definições do cliente, bem como adotar o glossário por ele estabelecido. Esta regra é especialmente importante no caso de documentos constitutivos de sociedades, pois muitas vezes o cliente reluta em alterar qualquer fórmula já adotada pela empresa. Assim sendo, se o tradutor pretender afastar-se da fórmula utilizada, deve apresentar ao cliente uma boa justificativa. As fontes já consolidadas como confiáveis e primordiais nesse tipo de tradução não devem ser descartadas; entre elas destacam-se o dicionário jurídico do Plácido e Silva e o Black’s Law Dictionary. Destacarei a seguir algumas dificuldades que encontrei com palavras cujas traduções dependem do contexto no qual estão inseridas. Qual seria a tradução para a palavra “lei”? Três são as possibilidades: law é a mais conhecida, seguida por act, e finalmente, o falso cognato statute (por exemplo, Statute of Fraud corresponde a “Lei de Fraude”). Em contrapartida, qual seria a tradução de law? O primeiro significado que temos em mente seria “lei”. Essa tradução é utilizada no sentido estrito da palavra, ou seja, quando se refere a uma norma, ou seja, a Lei do Divórcio. Quando ela é precedida de artigo indefinido ou seguida de “s”, certamente sua tradução será “lei”. Contudo, no sentido amplo, law é traduzido como “Direito”, significando um sistema de princípios. Por sua vez, a palavra jurisdiction pode ser traduzida como “jurisdição” (aspecto geográfico), “competência” (área para a qual um juízo é competente para proferir sentença) ou “Estado” (nação). Encontrado indiscriminadamente como tradução do termo counterclaim, “pedido em contrário” significa apenas “reconvenção”. E o que vem a ser uma reconvenção? Consulte o Dicionário Jurídico do Plácido e Silva! Alguém advinha o que possa ser uma “Carta de Conforto”? Não é uma carta enviada a um amigo quando esse perde um ente querido. Carta de Conforto é a tradução utilizada amplamente no mercado para o termo Comfort Letter, cujo conceito se assemelha ao de “Carta de Abono” ou “Carta de Recomendação”. Uma tradução literal e errada foi dada a esse termo e, infelizmente, ficou consolidada. Diante de tantas diferenças, fica muito difícil traduzir a matéria de direito de forma literal. Para isso precisamos buscar no estudo do Direito os conceitos de cada nomenclatura, traduzindo assim a idéia e não apenas as palavras. Daniela Schraider Mochny formou-se em Tradução e Interpretação pela Universidade Mackenzie, em 1995, e em Administração de Empresas pela mesma Universidade, em 1996. Tradutora há 10 anos, há algum tempo começou seus estudos de tradução jurídica, aperfeiçoando-se nos cursos do Caldas Law Studies Center. Quando não está traduzindo, gosta de mergulhar, nadar ou viajar.
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